Renata Moehlecke (Agência Fiocruz de Notícias)*
Na tarde deste sábado (23/1), a Fiocruz liberou ao Ministério da Saúde (MS) dois caminhões com as duas milhões de doses da vacina da AstraZeneca/Oxford importadas do Instituto Sérum, na Índia. As doses foram enviadas ao almoxarifado do MS, próximo à Fiocruz, para distribuição aos estados brasileiros. A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, abriu a cerimônia de liberação das doses com agradecimentos a todos os atores envolvidos no esforço da vacina e mencionando o recado do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. “Falo em nome do ministro da Saúde, que me pediu para transmitir sua mensagem de satisfação pelo trabalho realizado e pelo compromisso com o Programa Nacional de Imunização, com as vacinas para Covid-19. Neste momento, o ministro está indo para Manaus, levando 5% dessas duas milhões de doses, de modo a atender a população idosa de mais de 70 anos”. Na ocasião da cerimônia, médicos da Fiocruz foram os primeiros a serem imunizados no Brasil com a vacina da AstraZeneca/Oxford.
Fiocruz liberou ao Ministério da Saúde (MS) dois caminhões com as duas milhões de doses da vacina da AstraZeneca/Oxford importadas do Instituto Sérum, na Índia (foto: Divulgação)
Com a chegada das duas milhões de doses de vacinas no Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz), no início da madrugada deste sábado, as vacinas passaram por conferência e avaliação de temperatura para verificar se estavam em perfeitas condições, após o trajeto da longa viagem vindo da Índia. Pela manhã, teve início o processo de etiquetagem de quatro mil caixas, que receberam adesivo com informações técnicas em português, como lote, fabricação, validade, temperatura, entre outras. Cada caixa contém 50 frascos e 500 doses da vacina. Após a etiquetagem, ainda foi feita uma conferência do protocolo de produção e ocorreu a liberação de documentação pela Garantia da Qualidade. Ainda neste sábado (23/1), também foram coletadas amostras pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz) para análise de protocolo e liberação do produto para que o Programa Nacional de Imunizações (PNI) possa distribuir aos estados. Toda a operação para liberação das vacinas seguiu normalmente, sem intercorrências e dentro do cronograma.
As vacinas passaram por conferência e avaliação de temperatura para verificar se estavam em perfeitas condições (foto: Divulgação)
Durante a cerimônia, o diretor de Bio-Manguinhos, Maurício Zuma, falou sobre a grande expectativa de milhões de brasileiros pelas vacinas, justificada pela difícil situação vivida no país. “Hoje é um dia especial. Esta vacina se soma ao esforço de vacinação de grupos prioritários, iniciado na última segunda-feira em todo o território brasileiro”, afirmou Zuma. “As instalações de Bio-Manguinhos representam muito mais esperança: está prevista o início da produção, nas próximas semanas, de 200 milhões de doses da vacina até o final de 2021”.
Em seguida, o consul geral da Índia, Leonardo Ananda, apontou o momento simbólico, no qual a Índia auxilia os brasileiros. “Mais um passo está sendo dado no combate a esta pandemia. Este é um marco histórico para relação entre a Índia e o Brasil, duas nações irmãs que estão fortalecendo os laços a cada dia”, celebrou. “Estamos aqui na Fiocruz vendo os cientistas, médicos, pesquisadores e profissionais desta casa realizando o seu lindo dharma de salvar vidas”, comentou. “A Índia se orgulha muito de estabelecer uma parceria sólida e forte com o Brasil”.
Pesquisadora de Oxford que coordena os ensaios clínicos com a vacina no Brasil, Sue Ann Clemens destacou os principais dados sobre a qualidade e eficácia da vacina. Segundo ela, a Universidade de Oxford tinha a missão de trazer uma vacina universal, com impacto na saúde pública mundial e de baixo custo. “Assim aconteceu. A nossa vacina tem eficácia de 70% após a primeira dose e 100% de eficácia contra hospitalização e forma grave da doença”, destacou. “Hoje a vacina chega ao Brasil, mas já foi aplicada em 17 países e três milhões de pessoas, mostrando a segurança e confiança”.
Clemens chamou atenção ainda para as possibilidades que esta vacina traz no combate a pandemia. “A vacina que será produzida na Fiocruz poderá ficar até 48 horas com frasco aberto e acondicionado para que não se perca a dose. Isso é muito importante em um sistema de saúde”, explicou. “A vacina terá eficácia 22 dias após a primeira dose. Pelo tempo dos ensaios clínicos até o momento, a primeira dose confere proteção certa até três meses depois e, com a dose de reforço, essa proteção aumenta para 80% e é prolongada, mantendo os 100% de eficácia para hospitalizações e casos graves da doença”.
O secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Daniel Soranz, também esteve na cerimônia. “A vacina é um símbolo de muito investimento numa instituição centenária como a Fiocruz e no desenvolvimento do Complexo Econômico e Industrial da Saúde brasileiro. É um símbolo também de muitos que idealizaram o [Sistema Único de Saúde] SUS, pois vai ser aplicada em todos que precisam, independentemente de sua condição social”, pontuou. A fala de Soranz foi complementada pela do Deputado Federal Luiz Antonio Teixeira Jr – Luizinho (PP/RJ), presidente da Comissão Externa de Enfrentamento à Covid-19 da Câmara dos Deputados. “A vacina é um grande passo contra a Covid-19. A ciência e a capacidade de produção brasileiras vão dar conta dessa tarefa, e o Brasil tem condição de ser autônomo em relação à saúde pública”. O secretário de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, Carlos Alberto Chaves, também representando o Governador do Estado do Rio de Janeiro, Claudio Castro, homenageou a Fiocruz e a rapidez para viabilizar a distribuição. “Vamos distribuir a vacina e amanhã estaremos voando para entregar a todos os municípios”.
Também esteve presente no evento o Arcebispo do Rio de Janeiro, o Cardeal Dom Orani Tempesta. “No momento mais difícil, de mais mortes na pandemia, acendemos com a Fiocruz uma chama da esperança, que como disse a presidente Nísia, vai ficar acessa até o início da produção própria da vacina em Bio-Manguinhos. Eu proponho que logo depois acendamos uma nova chama, para a conclusão do Complexo Industrial de Biotecnologia em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz, em Santa Cruz, vai aumentar enormemente nossa capacidade de produção e vacinas”.
Assista a cerimônia na íntegra.
A presidente da Fiocruz encerrou a cerimônia agradecendo aos trabalhadores da Fiocruz e da Saúde e mencionando a sinergia entre as diversas frentes de trabalho da Fundação. “Temos contribuído em diferentes frentes: na pesquisa sobre o vírus e a doença, com destaque para o Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo [IOC/Fiocruz]; no desenvolvimento de produtos tecnológicos, com os testes diagnósticos que produzimos; na pesquisa clínica de medicamentos e vacinas; e também de uma maneira muito intensa no nosso Centro Hospitalar para Covid-19 – INI”, afirmou. “Hoje, reforçamos os laços de toda uma rede científica e dos atores políticos com responsabilidade no enfrentamento da pandemia. É também uma marca da importância da ciência e tecnologia no combate a pandemia”.
Nísia ainda reforçou o compromisso de sua instituição. “A Fiocruz não exitará em cumprir a sua missão. Estamos determinados nesse momento a fazer um grande esforço em prol das vacinas e da vacinação”, afirmou. “Marcaremos este dia como o dia do início da vacinação com a vacina Oxford/AstraZeneca, agora também Vacina Covid-19 Fiocruz”, disse a presidente. “Não podemos esquecer o nosso motivo maior, que é salvar vidas da população. Por isso estamos aqui”.
Vacinação de profissionais de saúde da Fiocruz
Durante o evento, três profissionais foram selecionados para serem os primeiros vacinados com o imunizante da AstraZeneca/Oxford no Brasil, representando todos os trabalhadores da Fundação e da Saúde brasileira. São eles: o médico Estevão Portela, do Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), que é coordenador do estudo Solidarity, feito em parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS); a médica pneumologista do Centro de Referência Professor Helio Fraga (CRPHF/Fiocruz), Margareth DalComo; e a médica Sarah Ananda Gomes, coordenadora da equipe de Cuidados Paliativos no Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte (MG), onde participou das comissões de crise de Covid-19 (confira texto de Sarah Ananda).
A médica pneumologista do Centro de Referência Professor Helio Fraga (CRPHF/Fiocruz), Margareth DalComo, foi uma das primeiras a ser vacinada, representando os profissionais de saúde da Fundação (foto: Divulgação)
“Agradeço à Fiocruz por ter me convidado para esse momento tão simbólico, de esperança. É uma mensagem muito positiva para todos os nossos companheiros de trabalho, nossos colegas profissionais de saúde, para a população brasileira. Haverá de chegar o dia em que faremos realmente uma grande celebração, quando a Fiocruz tiver iniciado a sua linha de produção e nós pudermos vacinar uma grande parte da população brasileira, que é o nosso objetivo no controle dessa epidemia”, declarou Margareth DalComo. “Continuamos o nosso trabalho auxiliando à Fiocruz e à população a entender o que está acontecendo, com uma mensagem positiva de confiança”.
Chegada das vacinas importadas ao Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão / RJ)
O voo comercial de chegada das vacinas prontas importadas da Índia aterrizou (22/1), no Rio de Janeiro, às 22h, após passagem por trâmites alfandegários no Aeroporto de Guarulhos (SP). A presidente da Fiocruz, Nísia Lima Trindade, e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, receberam as doses, que seriam transportadas com escolta da Polícia Federal (PF) ao depósito da Fiocruz.
A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, os ministros da Saúde, Eduardo Pazuello, das Relações Exteriores, Ernesto Araujo, e o embaixador da Índia no Brasil, Suresh Reddy receberam as doses da vacina em aeroporto no Rio de Janeiro (foto: Agência Brasil)
Durante pronunciamento oficial na base área do Galeão, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, falou sobre o esforço da Fundação no enfrentamento da pandemia no país. “A Fiocruz, em seus 120 anos, diante de uma pandemia que se coloca com tanta gravidade no nosso país e no mundo, vem trazer uma mensagem de esperança com a Vacina Covid-19 no Brasil, desenvolvida originalmente pela Universidade de Oxford, com a qual viemos trabalhando em um acordo de encomenda tecnológica e transferência de tecnologia. Nesse momento de perdas, ter a vacina é uma esperança que vem da ciência e do Sistema Único de Saúde [SUS]”, destacou Nísia. “Agradeço a toda a nossa equipe da Fiocruz, que se dedicou com muita garra e muita vibra a esse resultado, e a todos que nos acompanharam nessa trajetória. A vacina pode ser comparada na História do mundo a água potável para a saúde das populações. E, diante dessa pandemia, é com as instituições de ciência e tecnologia e com o SUS que nós poderemos trabalhar para superar essa crise junto com todas as vacinas que vierem a ser registradas pela Anvisa”.
A presidente da Fundação também reforçou o compromisso da Fiocruz de trabalhar em prol da saúde da população para viabilizar a vacinação. “Vamos construir a cada dia, avançando para que possamos dar essa cobertura a população. A vacina que hoje chega ao nosso país tem 70% de eficácia e poderá ser administrada em um intervalo de 12 semanas. Isso será muito importante para o nosso sistema de saúde”, afirmou. “Temos muito trabalho a fazer. Vamos produzir a vacina em Bio-Manguinhos na Fiocruz e esse é um passo muito importante para iniciarmos a vacinação. Vamos reforçar a vacina e a vacinação no nosso Programa Nacional de Imunizações”.
O ministro Pazuello também abordou a importância do evento. “Esse processo começou com a AstraZeneca-Oxford em junho do ano passado. São sete meses de trabalho para chegarmos até aqui. Trabalho ininterrupto com a Fiocruz”, comentou. “O país tem que estar unido para fazer frente a esta pandemia. A união de todos vai nos dar a vitória no final”. Ele também agradeceu as equipes técnicas da Fiocruz e do Ministério da Saúde, e destacou o SUS como a grande ferramenta para fazer a saúde pública do país. “É uma estrutura que permite a capilaridade até a ponta da linha e o maior sistema de saúde pública do mundo. Sem esse sistema não poderíamos ter feito combate ao coronavírus”.
Em obediência às normas regulatórias, as vacinas passaram por checagem de qualidade e segurança (foto: Fiocruz)
Também estiverem presentes na ocasião o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e o embaixador da Índia no Brasil, Suresh Reddy. Em obediência às normas regulatórias, as vacinas seguiram do aeroporto para a Fiocruz para checagem de qualidade e segurança, além de rotulagem, com etiquetagem das caixas com informações em português. Esse processo ocorreu no Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) ao longo da madrugada e na manhã deste sábado (23/1), por equipes treinadas em boas práticas de produção.
*Com contribuição de Gustavo Mendelsohn de Carvalho (CCS/Fiocruz) e informações de Bio-Manguinhos/Fiocruz.