Em resposta às projeções de aumento do número de casos de câncer no Brasil, a Associação Paulista de Medicina (APM) destaca inovações tecnológicas que têm o potencial para redefinir a luta contra a doença no país. A divulgação vem em um momento crítico: dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS) sugerem o crescimento de 77% dos diagnósticos no mundo, nos próximos 25 anos.
Para o Brasil, as estimativas apontam para mais de 1,1 milhão de novos pacientes anuais em 2050, representando alta de 74,5% em relação aos números deste ano, segundo informações da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer. O Instituto Nacional de Câncer (Inca) calcula que ainda este ano cerca de 704 mil brasileiros receberão diagnóstico de algum tipo de tumor.
Enquanto os avanços terapêuticos oferecem novas esperanças para o tratamento, especialistas enfatizam que a prevenção continua sendo fundamental. Compreender como prevenir o câncer de pulmão e outros tipos de tumores através de mudanças no estilo de vida pode reduzir a incidência da doença, complementando os avanços tecnológicos apresentados pela APM.
Os principais avanços destacados pela APM incluem:
- Imunoterapia de nova geração: anticorpos monoclonais e inibidores de checkpoint;
- Inteligência Artificial (IA): diagnóstico precoce com até 6 anos de antecedência;
- Vacinas personalizadas: tecnologia RNA mensageiro adaptada ao perfil do paciente;
- Oncologia de precisão: tratamentos baseados no perfil genético do tumor;
- Terapia CAR-T: modificação genética de células de defesa;
- Biópsia líquida: detecção não invasiva através de exame de sangue;
- Procedimentos minimamente invasivos: redução do tempo de tratamento.
Imunoterapia transforma sistema imunológico em arma contra tumores
A imunoterapia representa um dos avanços no tratamento oncológico. O princípio parece simples: transformar o sistema imunológico do próprio paciente em uma “arma” contra o tumor. Essa estratégia, que rendeu o Prêmio Nobel de Medicina a seus criadores em 2018, funciona bloqueando os mecanismos que as células cancerígenas desenvolvem para se esconder das defesas naturais do organismo.
Embora existam mais de 60 indicações clínicas aprovadas para imunoterápicos, apenas uma pequena parcela dos pacientes (menos de 10%) pode se beneficiar desses tratamentos, conforme estudos científicos. A explicação está nas características moleculares particulares de cada tumor, que determinam se o medicamento será ou não eficaz.
Durante a décima edição do Congresso Internacional Oncologia D’Or, o professor da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Oncologia D’or, Paulo Hoff, apresentou uma perspectiva otimista. Segundo ele, as próximas gerações desses medicamentos prometem ampliar o número de pacientes elegíveis para a terapia.
Entre as categorias mais promissoras estão os anticorpos monoclonais, que incluem três tipos principais: conjugados à quimioterapia, ligados a partículas radioativas e os biespecíficos. Esses tratamentos miram alterações específicas nas células tumorais, poupando as células saudáveis. Os efeitos colaterais da imunoterapia, embora presentes, tendem a ser mais toleráveis do que os observados com quimioterapias convencionais.
Benefícios da imunoterapia em cânceres de cabeça e pescoço
O tratamento de carcinomas escamosos de cabeça e pescoço acaba de ganhar um novo aliado. O estudo internacional “NIVOPOSTOP” demonstrou benefícios da imunoterapia como complemento à cirurgia. A pesquisa, coordenada pelo radioterapeuta oncológico Yungan Tao, foi apresentada durante a sessão plenária do congresso de 2025 da American Society of Clinical Oncology, onde Tao classificou os resultados como “o primeiro grande avanço neste cenário clínico em mais de duas décadas”.
O ensaio clínico, conduzido entre 2018 e 2024 em seis países, incluiu 680 pacientes com carcinoma escamoso localmente avançado que apresentavam fatores de alto risco para recorrência.
Os resultados mostraram que a adição de um anticorpo monoclonal anti-PD-1 reduziu em 24% o risco de recorrência ou morte, elevando a taxa de sobrevida livre de doença em três anos de 52,5% para 63,1%.
Tecnologias aceleram diagnósticos e personalizam tratamentos
Cada vez mais, modelos computacionais de Inteligência Artificial (IA) conseguem analisar exames de imagem com alta precisão, permitindo a detecção precoce de riscos cancerígenos anos antes do aparecimento de sintomas. Essa possibilidade oferece uma alternativa para o diagnóstico antecipado, sobretudo em locais onde há escassez de profissionais especializados.
Outra tecnologia – impulsionada pelos estudos reforçados durante a pandemia de Covid-19 – são as vacinas personalizadas contra o câncer, desenvolvidas com tecnologia de RNA mensageiro, que mostram resultados promissores em ensaios clínicos. As medicações “treinam” o sistema imunológico para reconhecer e atacar células cancerígenas de forma específica, sendo uma abordagem menos invasiva e com menores efeitos adversos.
Além dos avanços em diagnóstico por IA, a área da oncologia de precisão tem revolucionado os protocolos terapêuticos ao considerar características genéticas específicas de cada tumor – ela permite que a equipe médica “leia” o DNA do tumor e escolha qual medicamento funciona melhor para cada caso. Para os pacientes, isso representa mais qualidade de vida durante o tratamento e melhores chances de cura.
Em seu modelo avançado, o sequenciamento genético possibilita o mapeamento de mutações específicas em milhares de tumores, identificando assinaturas genéticas únicas. Quando são aplicadas as terapias mais eficazes baseadas no perfil genético individual de cada paciente, aumentam as taxas de resposta e diminuem os efeitos adversos.
Procedimentos menos invasivos também ganham relevância, com injeções que anteriormente demandavam uma hora para administração intravenosa sendo aplicadas em poucos minutos. Medicações quimioterápicas e alvo-moleculares de uso oral ampliam opções terapêuticas, conforme especificidades de cada caso. Técnicas como ablação também expandem as opções, sendo importante compreender para que é indicada a ablação em diferentes cenários oncológicos.
Terapia CAR-T e biópsia líquida integram inovações
A terapia CAR-T marca um ponto de inflexão na imunoterapia contra leucemias e cânceres hematológicos. O procedimento envolve a modificação genética das células T extraídas do próprio paciente – um processo que as reorienta para reconhecer e destruir células cancerígenas com precisão direcionada.
Casos de pacientes com subtipos agressivos de leucemias, linfomas e mielomas tratados com CAR-T experimentam remissões duradouras, conforme estudos. Os efeitos indicam o potencial da terapia para transformar o tratamento do câncer, embora haja a necessidade de mais estudos para avaliar a segurança do método.
A biópsia líquida vem ganhando terreno como uma alternativa ao procedimento tradicional. A abordagem identifica células cancerígenas a partir de uma simples amostra de sangue. Os resultados chamam a atenção da comunidade médica: em alguns estudos, a técnica demonstrou taxa de detecção superior a 80% em determinados tipos de câncer – com destaque para o de pâncreas, cuja taxa chega até 97% quando combinada com CA 19-9.
